O princípio da legalidade na ótica do Professor Freitas do
Amaral
O princípio da legalidade tem hoje a sua formulação
no artigo 3º do CPA e no artigo 266º/2 da CRP.
A administração pública tem o seu fundamento para prosseguir
o fim público, mas, tem que prosseguir o fim público em obediência à lei: é a isto
que se chama o princípio da legalidade.
A conceção de princípio da legalidade não é de todo pacífica, já
existiram várias doutrinas que abordam esta questão, entre elas Marcelo Caetano
que dizia que: “nenhum órgão ou agente da administração pública tem a faculdade
de praticar atos que possam contender com interesses alheios se não em virtude
de uma norma geral anterior” ou seja, era uma proibição.
No entanto, a doutrina mais recente (neste caso, o Sr.
Prof. Freitas do Amaral) vem entender que o princípio da legalidade se
identifica com as conceções mais modernas e não com a do Prof. Marcelo Caetano.
Sendo assim, nesta nova abordagem a este princípio, “os órgãos e os agentes da
administração pública só podem agir com fundamento na lei e dentro dos limites
por ela impostos”, já não existe como uma proibição, mas sim como forma
positiva, pois hoje em dia, a lei pode ser vista como o fundamento das ações da
administração.
Assim, a administração tem hoje uma determinada
liberdade que não tinha antes, pode tomar as suas decisões e atuar como bem
quiser, exceto quando a lei o proíba.
Antes de mais, deve ser especificada a evolução histórica deste
princípio tão importante, que passou épocas bastante conturbadas. Primeiro,
passara por uma época de monarquia absoluta, em que o poder seria absoluto,
logo não haveria qualquer tipo de limitação pela lei. Mais tarde, com a
revolução francesa, surge uma nova época, a do estado de direito liberal, em
que se estabelece uma “subordinação à lei”.
Com certeza os tempos foram evoluindo e, é na
Europa, mais concretamente no século XIX, com a chegada de novos regimes
políticos, que o princípio da legalidade se assume não apenas como um limite da
ação administrativa, mas sim como o verdadeiro fundamento da ação
administrativa, assim, a administração pública age conforme e na medida em que
a lei lho permita.
Assim, na nossa atualidade e no nosso Direito, o
princípio da legalidade assume várias funções, mas essencialmente tem a função
de “assegurar o primado do poder legislativo sobre o poder administrativo,
porque o primeiro emana da soberania popular e a representa, enquanto o segundo
é meramente defensor de uma autoridade derivada e secundária”; mas, por outro
lado, vem desempenhar a função de garantir os direitos e interesses dos
particulares.
Passando para outro ponto importante, deve fazer-se
uma breve abordagem ao conteúdo, objeto e às modalidades do princípio da
legalidade: quanto ao conteúdo, este princípio deve respeito à lei e a todo o
bloco de legalidade (entendido na conceção de Hauriou); relativamente ao
objeto, diga-se que os regulamentos, contrato administrativo, o ato
administrativo e até fatos jurídicos têm que respeitar a legalidade; por fim,
quanto às modalidades, diga-se que é aqui incluída a preferência de lei –
nenhum ato administrativo pode contrariar o bloco de legalidade, pelo que, se o
fizer, o mesmo será ilegal e a reserva de lei – todos os atos inferiores à lei
têm que ser praticados com justificação no importante bloco de legalidade.
Mas, note-se que, existem exceções a este tão
importante princípio: a teoria do estado de necessidade em que, em algumas
exceções, a administração pública fica desobrigada de seguir determinado
procedimento baseado na lei com estabelecimento para determinados motivos
normais e poderia atuar sem forma de processo, esta teoria baseia-se no artigo
3º/2 do CPA; a teoria dos atos políticos, que não é considerada por Freitas do
Amaral uma verdadeira exceção do princípio da legalidade, baseia-se no fato de
os atos do exercício político “não são suscetíveis de recurso contencioso
perante os tribunais administrativos”; e por fim, o poder discricionário da administração,
que também não é considerada uma verdadeira exceção na conceção do Prof.
Freitas do Amaral, dado que se carateriza por “Só não há poder discricionário
aí onde a lei os confere como tais”, a justificação que o prof. dá é que
existem sempre pelo menos dois elementos ligados pela lei – diga-se a
competência e o fim.
Outro ponto importante que se deve referir neste
pequeno texto alusivo ao princípio da legalidade é a sua natureza e âmbito. A administração
pública poderia aparecer em dois sentidos distintos, a administração agressiva,
caraterizada por um sentido de autoridade e poder; e a administração prestadora,
uma administração que confere bens, principalmente como um serviço público, este
tipo de administração surge a beneficiá-la e não a restringi-la como a
primeira.
Mas, na conceção do direito português, este
princípio vem cobrir toda a atuação da administração pública? É afirmativo, não
cobre apenas toda a atuação da administração agressiva, mas existem
justificações para esta afirmação: ora, o princípio da legalidade vem apontar
expressivamente para o artigo 266º/2 da CRP; para além dessa norma, é importante
referir que, a administração prestadora não beneficia sempre os particulares,
mas porquê? A nossa lei deve estabelecer normas, tem de existir um fundamento,
um objetivo para a administração pública atuar assim. No entanto, quando a
administração pública se admite como prestado pode estar a desprezar alguns
direitos dos particulares.
Ora, dadas as circunstâncias, parece que a
administração pública independentemente de tentar progredir na sua atuação,
está a limitar direitos dos particulares. E não só, quando se assume a
administração como prestadora, poderá estar a abandonar-se um princípio
crucial, a chamada “regra de ouro do Direito Administrativo” em que é a lei que
deve “definir o interesse pública a cargo da administração”.
Cláudia Sereno C. André
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