Antes de mais nada boa noite, temos de acabar a matéria relativa aos
princípios aplicáveis à atuação administrativa e depois vamos dar início da
nossa matéria que diz respeito ao procedimento.
A matéria dos princípios já tinha sido explicada quase integralmente
na aula passada, se tanto me lembro só ficou de referir o princípio da
colaboração com a união europeia. Este princípio é um princípio novo que
corresponde à lógica da administração portuguesa enquanto realidade integrada
na administração europeia e portanto aquilo que aqui está, é algo que
corresponde à lógia dos dias de hoje, em que a administração pode funcionar em
rede.
A existência de uma união europeia, que tem uma ordem jurídica
própria, que se sobrepõe com a ordem dos estados membros. Esta ordem da união
europeia trás consequências do ponto de vista jurídica e do ponto de vista da
administração, a atividade administrativa europeia é realizada pelas
autoridades nacionais que aplicam o Direito Europeu.
Este código ao consagrar este princípio, quis mostrar uma ideia de
abertura à europa, não obstante da minha perspetiva, eu diria que apesar de
tudo esta cooperação leal com a União europeia, que aparece aqui nestes
princípios que é uma boa regra, eu diria que apesar de tudo houve pouca Europa
nestas normas que o legislador aqui nos apresentou. E tive de ocasião de
escrever isso quando foi apresentado este código, é um artigo dos cadernos de
justiça administrativa suponho de 2014/2015, de setembro/outubro, um congresso
realizado no verão, e na minha perspetiva, houve se por um lado normas que
introduzem uma dimensão europeia, por outro lado, há normas que, na minha
perspetiva, deviam ter sido consagradas no CPA.
Isto até em termos comparativos com o que se passa em outras ordens
jurídicas, nomeadamente o ordenamento francês, italiano e do direito alemão, há
um conjunto de regras e princípios da união europeia, que são princípios de
procedimento administrativo que o legislador poderia ter consagrado em termos
mais amplos do que aqueles que fez. E há uma série de documentos normativos no
quadro do funcionamento da EU, que o legislador, de alguma maneira se esqueceu
nesta matéria.
A cooperação leal, eu nem sequer gosto muito da expressão, mas é uma
ideia de necessidade de cooperação, a lógica da administração a funcionar em
rede, tem a ver com aquilo que já falamos da dupla dependência do direito
administrativo com o direito europeu, o direito administrativo depende do
direito europeu, depende das opções administrativas da EU, mas o direito da EU
também depende do direito administrativo, porque sem ele, os direitos dos
estados-membros não se aplica, portanto há uma relação de dupla dependência que
este artigo procura consagrar, embora de uma forma relativamente (‘). Eu tenho
pena que o legislador não tenha aproveitado noutras normas, é certo que quando
fala da invalidade veremos que é inválido o ato que viole as normas da união
europeia, isto é, uma manifestação da dupla dependência. Mas eu penso que o
legislador devia ter ido mais longe e lamento que por ex. este artigo 19º não
faça referência à lógica da administração em rede, porque é isso que
corresponde à lógica da União europeia. Há um subsistema administrativo que se
relaciona com outros subsistemas em todos os níveis, na saúde, no ensino,
enfim, e essas relações não passam pelo governo, é apenas entre as entidades
inter administrativas.
E se, como veremos, na aula de hoje, o código também consagrou o
balcão único, esta rede do balcão único, que resulta de uma diretiva europeia,
por um lado não está consagrado em termos tão amplos como resulta da diretiva
da união europeia, não prevê o uso das línguas nacionais da união europeia,
obrigando à tradução das entidades administrativas. O legislador agiu ao
contrário, não deixa de ser até algo irónico. O legislador que quis legislar
para uma administração pública integrada na Europa, o legislador parece que se
preocupou pela 1ª vez em consagrar o princípio que o procedimento é em língua
portuguesa, como se houvesse alguma dúvida de que o procedimento fosse noutra
língua. É uma manifestação de pouco nacionalismo, quando o legislador diz que
corresponde às autoridades da união europeia, deviam haver autoridades que
traduzissem para a língua do país e também na língua do cidadão estrangeiro da
união europeia e que tem uma relação com a administração pública.
E portanto, do ponto de vista europeu, tem que ter uma decisão na
língua no seu próprio poder, é um direito da união europeia, que resulta da
carta dos direitos fundamentais da união europeia.
E portanto, não deixa de ser irónico quando o legislador devia ter
estabelecido estes mecanismos europeus, ele se preocupe apenas com a língua
portuguesa, como se tivesse havido até agora algum problema com o uso da língua
portuguesa, como se o único procedimento em Portugal tivesse feito noutra
língua e portanto há coisas que não é preciso legislar, quando a realidade
normal é a língua portuguesa, o que é preciso legislar é a exceção.
E portanto, uma das críticas que eu deixava ao legislador do CPA
português nesse artigo crítico da orientação seguida em 2014/2015, há mais
europa que no código anterior. Há aqui sobretudo regras que são da União
Europeia, não estando cá resultam de diplomas avulsos e havendo um CPA o seu
lugar certo era no CPA como resulta dos outros países.
Isto digo, vamos então agora passar a outro capítulo em que analisamos
as questões procedimentais e analisamos o procedimento.
Este capítulo eu intitulei-o de forma provocativa e de forma irónica,
como “A viagem ao centro do Direito
Administrativo”, isto tem a ver com as conceções dominantes acerca do
que é o Direito Administrativo de hoje.
A conceção clássica fazia do ato administrativo o centro do direito
administrativo, o ato administrativo era tudo e todas as coisas, a verdadeira
realidade que realmente interessava no quadro do Direito Administrativo era o
ato. E este ato, foi concebido no séc. XIX e início de séc. XX como um ato
autoritário que definia autoritariamente a posição dos particulares em face dos
súbditos, era a expressão de Otto Mayer, o ato administrativo é o que define os
direitos dos súbditos no caso concreto, o particular não tinha direitos em face
da administração, era um súbdito em face do Direito.
A lógica de Maurice Hauriou era similar, ele falar dos privilégios
exorbitantes da administração, e das leis exorbitantes tanto ao nível da
produção como ao nível da execução, temos ocasião de numa próxima aula de falar
na teoria do ato. Mas esses dois aspetos tradicionais, foram teorizados
classicamente nos finais do séc.XIX e nos inícios do séc.XX não fazem mais isto
nos dias de hoje.
A administração não define o Direito, a administração diz ao Direito
para satisfazer necessidades coletivas e os atos imperativos são para
satisfazer a execução coativa. A maioria dos atos não pode ser coativamente
executada, trata-se de um ato favorável ou prestador, não faz sentido executar
este ato.
Mas se, o centro do direito administrativo deixou de ser o ato
administrativo, resultou de novas formas de atuação administrativa: os
contratos, os regulamentos, os planos, atuações informais, técnicas, tudo isso
corresponde a formas de atuação da administração que não cabem no quadro de uma
lógica estreita exclusiva com o ato administrativo.
Mas também, a administração se transformou, deixou de ser autoritária
como correspondia ao modelo do ato de definição de atuar no caso concreto. E
portanto, há que introduzir aqui uma nova realidade, no âmbito do direito
administrativo.
Aquilo que começou a surgir a partir dos anos 60, foi a ideia de que
era preciso encontrar alternativas dogmáticas à teoria do ato administrativo e
que o direito administrativo não podia ser apenas o Direito do ato
administrativo, mas sim o Direito de toda a atuação administrativa, devia
entender todas as formas de atuação da administração.
E esta realidade levou a que se procurassem duas alternativas: a
alternativa do procedimento administrativo e a alternativa da relação jurídica
administrativa. Estas duas alternativas surgiram nos anos 60 e 70, a ideia de
que a alternativa ao ato administrativo era o procedimento, era uma ideia de
origem italiana, foram os italianos que teorizaram a bela teoria do
procedimento administrativo e o procedimento surgia como uma realidade que era
anterior e posterior ao ato administrativo e era comum a todas as formas de
atuação, a atuação administrativa não cai do céu aos trambolhões, é um
resultado de um procedimento, um procedimento que regula a tomada de decisão
por parte da administração, o modo como a atuação deve ser realizada, a atuação
dos particulares nessa decisão, ou seja, há regras procedimentais antes da
prática de qualquer atuação administrativa. O ato é diferente do procedimento
do regulamento ou de uma atuação informal, mas há sempres procedimentos
administrativos. Significa ir além do ato administrativo, significa que ir além
do procedimento do ato é preciso olhar o que está antes e o que está depois do
ato administrativo. Significa integrar todas as atuações administrativas no
quadro desta situação.
O que está aqui em causa, é a ideia de que o ato administrativo é
apenas uma fotografia, uma fotografia instantânea de relações em movimento,
para perceber tudo o que se passa entre o quadro entre o particular e a administração,
não basta olhar para a fotografia, é preciso ver o fundo todo, é preciso ver o
que aconteceu antes e depois, não é possível apenas olhar para o ato, o ato não
é tudo, há realidades anteriores e realidades posteriores ao ato.
E o procedimento administrativo, surgiu no quadro do direito italiano,
utilizado por Nigro, Caccese e aceite hoje por toda a doutrina italiana, como
alternativa dogmática da teoria do ato administrativo. O centro do direito
administrativo deve ser o procedimento, porque o procedimento é muito mais
amplo que o ato, permite entender antes e depois do ato e permite ver as
realidades em que não há ato administrativo.
E portanto, surgiu uma construção que valoriza autonomamente o
procedimento, e vão ver porque é que isto é importante, designadamente para
criticar o legislador português na última reforma do CPA. Aquilo que a doutrina
italiana faz é o contrário, é valorizar o procedimento como uma realidade
autónoma e que corresponde ao centro do direito administrativo.
No quadro do direito alemão e de acordo como uma orientação
subjetivista, o ato administrativo tende a ser substituído pela ideia relativa
administrativa e a relação jurídica administrativa tem também a vantagem de
existir em todos os casos, há sempre relações jurídicas, há relações jurídicas
procedimentais, substantivas e processuais. Existe seja qual for a forma de
atuação e por outro lado, as relações jurídicas também servem para explicar o
que se passa antes e depois da tomada de decisão administrativa e nos dias de
hoje, estas duas realidades, de alguma maneira se encontraram, a ideia de
relação jurídica também envolve o procedimento e não deixa de que o legislador
português, nos arts. 68º e ss. do CPA, adotando uma boa orientação acerca do
procedimento administrativo.
E portanto, eu diria que embora que com orientações e origens
diferentes, quer a construção objetivista italiana com o procedimento novo quer
a orientação subjetivista alemã que é fazer a ação jurídica administrativa o
novo centro do direito administrativo, aquilo que está em causa num caso e
noutro é uma realidade similar, uma tentativa de responder ao moderno direito
administrativo.
O ato administrativo é apenas uma das formas de atuação
administrativa, já não é a forma.
Quer a noção de procedimento, quer a noção de relação jurídica
administrativa são realidades que permitem essa valoração. Ora bem, isto passa
também por uma nova filosofia do direito administrativo, tão importante como a
decisão final é o modo como essa decisão é tomada, a valorização autónoma passa
por valorizar uma origem que dá à decisão e responde à execução dessa decisão,
corresponde por valorizar a integralidade da relação entre o particular e a
administração. E portanto, o que está aqui em causa é uma tentativa de
introduzir uma nova dimensão do direito administrativo.
E isto, implica a superação de um entendimento clássico do
procedimento, que era o da subalternização do direito administrativo a outra
realidade.
No início o procedimento era subalternizado ao processo, dizia-se que
era a lógica monista teorizada pelo prof. Marcelo Caetano e isto significava
conceber o procedimento à semelhança do processo civil, uma realidade mais
específica da administração e portanto, formalizar excessivamente a ideia de
procedimento e ao mesmo tempo ter um processo que tinha uma lógica de
subalternização do procedimento ao processo, significava uma lógica de
desvalorização do procedimento e a desvalorização do processo enquanto pólo de
resolução dos litígios administrativos.
E, não faz sentido, nos dias de hoje usar esta realidade no momento em
que Portugal tem o princípio entre separação e justiça, já não faz sentido
subalternizar o procedimento, que o prof. Marcelo Caetano chamava processo
administrativo contencioso, relativamente ao processo contencioso. Uma coisa é
o contencioso outra coisa é o procedimento da administração. Distintos são os
poderes de um e outro.
Esta ideia originária é ultrapassada e pertence aos traumas da
infância difícil do direito administrativo.
Também me parece errada a subalternização do procedimento ao
procedimento final, balizar a decisão final. Vamos ver aqui e julgo que o
legislador da reforma do CPA enfermou desta subalternização, vamos ver isso
melhor na próxima aula em que vamos ver as regras que o legislador estabeleceu
e quando vem dizer desde que a decisão substantiva o ato seja concreto, não
interessa se foram cometidas ilegalidades procedimentais. Ou seja, tudo é
subvalorizado à decisão final. E esta visão também é errada, porque o
procedimento tem um valor próprio, é uma realidade que não pode ser esquecida
no quadro do moderno direito administrativo, por um lado, esta
multifuncionalidade significa que o procedimento é um fator de legitimidade das
decisões administrativas, as decisões administrativas são mais legítimas porque
resultam da participação dos particulares desse procedimento, é um instrumento
de legitimação das decisões administrativas.
Há um autor alemão muito conhecido, Nicholas NewMan que escreveu a
obra célebre de o procedimento conferir uma legitimação autónoma às decisões públicas,
as decisões são resulta de um procedimento, não pode haver uma decisão desfavorável
que o indivíduo não seja consultado. Há uma lógica consolidadora que
corresponde à lógica do procedimento administrativo. Mas, em segundo lugar, o
procedimento também tem uma função racionalizadora, é uma racionalização por
tomar uma decisão por parte da administração, mas esta racionalização também trás
a racionalidade da decisão, porque usar esquemas adequados em que se procura
analisar a racionalidade para tomar a melhor decisão possível, por um lado,
racionaliza a atuação administrativa (os italianos dizem que é um instrumento
de organização administrativa, é uma norma objetiva que adotam e, enfim, está
nas construções de Mario Nigro). A construção italiana passa pela logica de
ligar o procedimento à organização administrativa, o procedimento enquanto
unidade organizativa racionaliza o procedimento decisório.
Mas, em 3º lugar, o procedimento decisório tem outra função
fundamental, que é a de coser os interesses públicos e os interesses privados. Porque
o interesse público em abstrato não existe, ele tem que ser construído com o
procedimento, não faz sentido apenas do princípio geral e abstrato do princípio
da prossecução pública, porque não tem nenhuma efetividade, o que é preciso é
construir para uma decisão um procedimento adequado para aquelas decisões. Eu dou-vos
o ex. se pensarmos numa construção de uma ponte sobre o rio tejo, saber qual é
o melhor sítio para construir a ponte é uma questão de procedimento, não tem
uma resposta prévia, à partida. E podemos dizer, que o melhor local daria para
o ministro das finanças seria onde a ponte ficasse mais barata, do ponto de
vista do ministro da economia é o sítio que contribuir para desenvolver melhor
aquele sítio, sobre o ponto de vista do ministro da defesa o melhor aos
interesses estratégicos de Portugal, segundo o ministro do ambiente seria aquele
que não faria mal ao ambiente. Teríamos tantas decisões ideais quanto o nº de
ministros que tivéssemos. Há uma decisão de acordo com as suas atribuições
perspetivas.
É preciso um procedimento que considere todas estas dimensões e que
tome uma decisão adequada à realizada a todas estas finalidades, não basta uma,
é preciso coser os interesses públicos e só se consegue através da
procedimentalização das decisões administrativas. Mas o procedimento serve também
para coser os interesses públicos com os interesses privados, porque os interesses
privados no quadro da administração moderna são também essenciais no exercício
da função administrativa. A prossecução do interesse público deve ser assente
na nossa ordem portuguesa, na lógica dos particulares. E portanto, é preciso
saber quem é que é afetado por essa decisão.
Ex. da ponte vasco da gama, foi construída para não lesar nem os
peixes, nem as aves.
No procedimento se tomou uma decisão onde se considerou interesses públicos
e interesses privados, e portanto, a decisão foi melhor do que teria sido se não
houvesse procedimento e é para isto que serve o procedimento, serve para determinar
o interesse público no caso concreto.
Podia dizer que o interesse público não existe, não existe enquanto
realidade abstrata, o interesse público interessa para o funcionamento da
administração e há um interesse público que interessa para o procedimento e é
essa a sua função, é por isso que o direito administrativo não pode dispensar o
procedimento.
Mas, o procedimento ainda serve como instrumento de tutela dos
direitos dos particulares, se estes são prejudicados por uma decisão. Não há só
um direito de participação dos particulares, mas também um direito de audiência.
Como vamos ver, o código de procedimento, consagra um direito de audiência
como um momento essencial de qualquer procedimento administrativo, sem o qual
qualquer decisão não pode ser tomada. O art. 121º consagra este princípio, este
direito de audiência prévia que corresponde à tutela dos direitos dos
particulares. Como vimos no art. 124º, há casos que dispensa de audiência
(situações de urgência, sobretudo situações limitadas) e que tem alguma justificação,
mas o princípio geral do direito administrativo é que nenhuma decisão pode ser
tomada sem direito de audiência.
O prof. Freitas do Amaral dizia e bem, que tinha sido o CPA criado um
procedimento quadrifásico, as fases habituais do procedimento era a fase do início,
a fase da iniciativa, instrução e depois a fase da decisão, o procedimento era
trifásico. Mas depois do CPA, depois desta edição mantém este princípio, mas
agora há uma quarta fase, porque antes da decisão tem que haver obrigatoriamente
audiência dos interessados. É uma transformação radical no Direito
Administrativo Português.
Mas esta audiência é importante quando há direitos, porque tem uma
função preventiva da decisão dos tribunais, quer quando eles não existam.
Ex. da velhota que vai à esquadra da polícia contar a mesma história várias
vezes (nos EUA). É um bom exemplo em como a participação das decisões é um
instrumento para a melhoria das decisões, é um instrumento de qualidade das decisões
administrativas. Isto obriga por vezes, as autoridades públicas a criarem um interlocutor,
a criarem mecanismos de audiência dos particulares, mesmo quando os
particulares não tenham um direito (p.ex. o orçamento participativo em que o
cidadãos decidem onde vai ser feita a afetação de determinada verba),
mecanismos em que os particulares são obrigados a pronunciar-se. São mecanismos
que introduzem um mecanismo participativo no quadro da administração pública e
são realidades que introduzem a relevância autónoma do procedimento enquanto
tal.
O procedimento tem um valor em si mesmo, o procedimento não pode ser
dispensado, o procedimento tem uma valoração autónoma e é por isso que todas as
suas regras são essenciais.
Não resisto já introduzir algumas coisas que deixarei para a próxima
aula, não faz sentido que o legislador de procedimento, que não gosta de
procedimento dizer que quer se cumpra quer não se cumpra uma regra fundamental é
igual ao litro, se a decisão for boa, mas a decisão não pode ser boa se não for
tomada no quadro do procedimento. O procedimento tem um valor autónomo que não
permite superar em razão da bondade da decisão. Eu lamento que o legislador
tenha tomado uma posição subalterna do procedimento em relação à dimensão
final, e nesse sentido, essa parte do código de procedimento é menos bem
conseguida do que o resto da norma que aqui está em causa.
Mas, pensando então na preocupação do procedimento quadrifásico, as
quatro fases, são fases essenciais no quadro de qualquer procedimento. A fase
da iniciativa corresponde ao início do procedimento, o início pode ser
iniciativa do particular que pede à administração alguma coisa e desencadeia o
início do procedimento administrativo ou pode ser a título oficioso em que a
administração tem a oportunidade de começar qualquer tipo de procedimento.
Depois há uma segunda fase, é a fase da instrução, o legislador que se
preocupou com o procedimento quase nada diz sobre a instrução, a norma do art.
115º e ss. o que estabelecem são regras-prova, o que devia estar aqui era a
violação das informações, de todas as realidades que correspondem à visita ao
local, todos os meios indicados a instruir uma decisão e a decisão tenha todos
os elementos necessário para seja corretamente instruída. A administração não
está preocupada com a prova. E infelizmente isso está em leis avulsas, mas
julgo que o legislador do procedimento devia ter feito isso, procurado ao
regular esta matéria tratar das manifestações de execução procedimental.
Depois, há a audiência, aqui o legislador andou bem ao estabelecer o
princípio da audiência prévia, que segundo a minha perspetiva é um princípio
constitucional que decorre do princípio da participação e por isso, eu tenho
entendido, juntamente com o prof. Marcelo Rebelo de Sousa e prof. André Salgado
Matos, eu tenho decidido que uma decisão tomada sem audiência prévia é uma
decisão nula, que viola um direito fundamental e que portanto, deve ter a sanção
mais grave da ordem jurídica porque está a violar a constituição.
O argumento do prof. Marcelo não era exatamente pela via do direito
fundamental, o que é facto é que estamos de acordo com a sanção de culminar a
nulidade por uma decisão tomada sem audiência prévia.
A maior parte da doutrina, tende a considerar que há apenas uma
simples anulabilidade e por isso é menos grave, que são argumentos de ordem
formal, quanto ao conteúdo de direitos fundamentais, em que o legislador diz
que não faz sentido.
No caso de falta de audiência prévia no processo disciplinar, que é
quando ela é mais necessária, culmina a anulabilidade e a conclusão que tiram é
que os outros demais casos também devem ser de anulabilidade. Mas, com todo o
respeito, corresponde a uma administração de uma regra de inversão do
pensamento jurídico.
E portanto, este direito de audiência gera uma ilegalidade, o que é
facto é que esta regra tem sido razoavelmente cumprida no quadro português e
administração pública já percebeu que precisa dos particulares.
Nos anos 90, quando fizemos a primeira versão do código de
procedimento, consagramos este princípio da audiência prévia, toda a gente
dizia que isso não ia ser aplicável. Mas o que é facto é que hoje, em Portugal,
este direito é uma realidade de todas as atuações administrativas e valeu apena
fazer essa regra e em parte essa regra está ganha, o que ficará para a próxima
aula.
Cláudia Sereno C.André
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